É a verdade imprescindível na comunicação para que se alcance metas e objetivos? Lembro que quando a febre do compliance obrigou as empresas a estabelecerem padrões éticos nas relações com os diversos pontos de contato das marcas, o quesito verdade era uma bandeira presente em todos os manuais. Faz sentido. Parece óbvio que, sem a verdade como fundamento, nada se sustenta no exercício da transparência. No caso da comunicação, particularmente, não há como disfarçar nada, o que torna as coisas ainda mais dramáticas.
O conceito mais antigo de verdade foi expressado por Platão: “Verdadeiro é o discurso que diz as coisas como são, falso é aquele que diz como não são”. A serem contrastadas com uma sentença tão simples quanto sábia, as nossas práticas cumprem o dever de casa? Quanto das coisas “como são” e quanto das “coisas como não são” está presente no que afirmamos, seja no jornalismo, na política ou na publicidade?
Será possível ser absolutamente verdadeiro sem cometer sincericídio? São vários os fatores que podem conduzir uma linha de raciocínio em desacordo com a verdade, entre eles o fato de o interlocutor não estar interessado na verdade genuína, mas em satisfazer as suas convicções.
Nesse caso, a mensagem não busca enganar, mas valer-se de uma determinada expectativa, às vezes detectada em pesquisa, e atendê-la. É mais ou menos o que acontece com a supervalorização de certos predicados que não têm nada de essenciais do ponto de vista da racionalidade, mas que atendem, estados emocionais ou padrões de condicionamento de nichos ou targets. Será que algum potencial de mercado pode ser desperdiçado, em nome da transparência? A história já demonstrou que não, levando governos a intervirem nas relações de consumo com regulamentações rigorosas.
O caso dos cigarros é emblemático sob vários aspectos. Ao obrigar os fabricantes a escrever nas embalagens, em letras grandes “o cigarro mata” ou “o cigarro causa câncer”, em tese as autoridades públicas não estariam inviabilizando o negócio? Do ponto de vista ético, provavelmente. Afinal, colocar a marca nesse contexto parece uma verdadeira aberração de marketing.
Parece, apenas parece. Porque, na prática, nem fabricantes ficaram encabulados, nem fumantes ficaram preocupados, com a nova estética sinistra das embalagens de suas marcas preferidas. Claro que o faturamento conta por um lado, e o prazer de fumar por outro, como fatores mais valiosos do que qualquer advertência.
Curioso é que, do jeito que está, a comunicação da indústria do tabaco nunca foi tão verdadeira e transparente. Será que outros segmentos suportariam expor claramente os riscos que representam um consumo compulsivo, irracional? Até agora parece que ninguém se atreveu.
Pelo contrário, costumamos banalizar a compulsividade latente do consumidor de determinados produtos, tratando como piada, como mote para um comercial, por exemplo. As pessoas se reconhecem no chiste e gostam disso. Portanto, os conceitos de verdade e transparência acabam sendo levados pela onda do mar da vida como ela é.
Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing
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