Ao comentar com a minha mulher sobre o GP de Film do Cannes Lions deste ano, o filme “RIP Leon”, que achei bacana, mas nem tanto, ouvi a resposta que acendeu uma luz na minha mente feito aquelas cenas de Deus falando com os homens em filmes antigos, sabe?

Ela disse calmamente assim: o GP de Cannes, acima de tudo, manda um recado, e o deste ano está claro: o humor está de volta. Pimba!

Realmente, está ali no filme do lagarto do iPhone a simplicidade, o feature do produto como personagem principal de uma boa piada, de uma situação engraçada, com um “plot” surpreendente.

E ainda tem um bicho, o que sempre faz sucesso.

Além de comprovar o quanto ela é melhor publicitária do que eu (mas isso todo mundo já sabe), essa resposta mostra que estamos entrando em uma nova era, um caminho que já vem sendo traçado nos últimos tempos aqui e ali, mas que agora toma uma nova proporção.

O puxão de orelha que levei faz todo sentido.

Minha posição blazé em torno do GP de Film foi destruída com uma frase e me levou a um lugar que me agrada muito, pois concordo que não há jeito melhor para conquistar o consumidor do que pela emoção e, em tempos como esses, muitas vezes o humor é a melhor emoção porque “quebra” a pessoa e conquista o coração e a mente.

Mais de uma palestra do festival deste ano tratou de falar do quanto o humor é uma ferramenta fundamental na comunicação, que poderia estar sendo muito mais usada.

Ou então sobre a volta das campanhas engraçadas e o quanto funcionam para as marcas ou ainda do quanto o propósito pode ser tratado com leveza, bom humor e graça nas campanhas.

Palestras e painéis à parte, vimos muitas e cada dia mais ideias engraçadas premiadas e finalistas não só em Cannes, mas em muitos festivais internacionais.

As agências independentes mais comentadas hoje em dia, como Mischief e Joan, de NY; Uncommon, de Londres; e Talented Agency, da Índia; entre outras, têm em seu trabalho criativo muitas ideias cheias de humor e ousadia.

Ah, e todas bastante simples.

Também as agências mais criativas das holdings, como Adam&Eve DDB e BBDO NY, vêm apresentando campanhas cheias de humor e ótimos resultados tanto nas premiações quanto na repercussão das ruas e grupos de WhatsApp.

A gota d’água para escrever sobre o assunto pingou esta semana, quando vi o filme novo da Apple falando da bateria do iPhone.

Um agricultor em seu trator, numa estrada pequena de terra, andando na monótona velocidade de duas milhas por hora, rebocando uma abóbora gigante.

A música do filme é “Two Miles An Hour”, do Ludacris, que faz um contraste incrível com as imagens.

Quase no final do filme de um minuto, a gente ouve a voz do Waze falando “siga em frente por mais 102 milhas” e então aparece o lettering matador: “Nossa bateria com a vida mais longa. Relaxe, é o iPhone 14”.

Mais simples impossível.

E em vez de fazer algo com pegada tecnológica e sem prometer salvar o mundo com uma bateria mais longa, o filme conquista e faz sorrir de um jeito quase simplista.

Ainda melhor do que o GP deste ano do lagarto Leon, aquele que aprendi a achar que vai entrar para a história como o ótimo filme que mandou um recado potente para a indústria da propaganda global em 2023.

Gustavo Bastos é sócio e CCO da agência 11:21
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