Nunca fui de dar valor a defuntos. Falo de corpos sem vida, não da pessoa do falecido, em si. Velórios e enterros, entendo como meras formalidades sociais, das quais quase sempre me senti desobrigado de comparecer. E quando frequento, sempre tenho em vista os vivos, com quem me solidarizo pela perda, ou me associo no lamento.
Quando a vida deixa o corpo, acabou-se a razão de atribuir a este qualquer importância. O valor que a morte levou, passa a existir apenas em nossos pensamentos e memórias e nas obras deixadas. Aliás, fica desde já o meu futuro cadáver à disposição de alguma escola de medicina, se ainda servir para alguma coisa. Mas por que todo esse papo que beira o sinistro? Por causa da derrubada do antigo prédio da DPZ, na Avenida Cidade Jardim.
Tenho vivíssimos na memória os anos em que lá trabalhei e aprendi tanto. Sou orgulhoso por ter composto um time de campeões, sob o comando do Roberto Duailibi, do Francesc Petit e do José Zaragoza. Sentimento que viverá em mim, enquanto vivo eu estiver. Não faz falta que a sigla esteja em outro lugar, muito menos num lugar feito com cimento, aço e vidro. Tampouco, fazia falta que estivesse feito fantasma, num prédio desocupado. Não homenageio construções, não saúdo objetos inanimados.
Minha mente é absolutamente descondicionada de atribuir valor sentimental à matéria. A DPZ nasceu e viveu como produto da mente de três sujeitos brilhantes. Todo mérito residiu ali, tudo que eles fizeram foi reconhecido, premiado e remunerado, justamente. É o que importa. Como importam os profissionais lá formados que construíram, com o conhecimento adquirido, outros negócios que glorificaram seus professores. É romântico e literário atribuir ao edifício-sede da agência condição de templo.
Mas o fato é que a DPZ será sempre grande e real para toda uma geração de publicitários, porque consolidou neles um ideal da profissão. Um ideal vencedor, que fez história, inesquecível.
Somos depositários desse patrimônio, temos prazer em compartilhar nossas vivências com gente mais jovem, estimular esse encantamento por um trabalho criativo de qualidade. Sim, nossos mestres ensinaram que a profissão pode ser bem mais que um meio de vida, pode ser uma oportunidade única para a explosão do nosso talento.
A DPZ nunca se preocupou em frear o uso da sua grife para a glória particular de ninguém, tão majestosa e, ao mesmo tempo, tão generosa, sempre foi. Uma fórmula que teve tentativas de replicação, em alguns casos com sucesso relativo. Mas sem alcançar a mesma perenidade.
Aí reside a grande diferença, essa resistência ao tempo, aos movimentos do mercado, às ausências próprias da natureza da vida, às trocas de endereço, à vida abaixo de um monte de concreto. Porque se trata de um conceito construído, dia a dia, com muita coerência, ao longo de anos, de décadas. E que vive aqui, em mim, suficientemente cristalino e animado, para se transformar num texto, quem sabe, instigador da curiosidade de meninas e meninos que ingressaram na atividade há pouco tempo. É isso o que mantém a construção da DPZ de pé e sempre manterá.
Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing
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