Fernando Figueiredo diz que o modelo atual já se mostrou desgastado
A Bullet passou por momentos complicados durante a pandemia. Fernando Figueiredo, CEO e partner da agência, afirma que a pandemia mexeu com a cabeça de todos e criou novas referências. “As pessoas entenderam que com menos conseguiam fazer mais”. Para ele, o modelo atual de agência já se mostrou desgastado.
Segundo o executivo, 2023 será um ano que começará aquecido e bem definido. “Sabemos quem serão os governantes e o plano de governo. Um ano que o anunciante precisa fazer a roda girar, deixando a crise pra trás. Um ano com foco em resultados. Qualquer estratégia de marketing terá de trazer retorno rápido”.
Veja a seguir os principais trechos desta entrevista.
A Bullet se posiciona como uma das agências mais criativas de um mercado que dispõe de inúmeras delas também bastante criativas. Qual a razão dessa afirmação?
Criatividade é subjetiva. A Bullet se baseia pelo passado, presente e o que está disposta a fazer no futuro. Nossa criatividade e inovação sempre andaram de mãos dadas e a Bullet sempre liderou esse movimento. Promoções e eventos históricos, premiações diversas, entre elas o primeiro Leão de Cannes de Promo na história do país, e eleita nas últimas cinco edições do Agency Scope como a melhor agência apontada por clientes e mercado. São 30 anos. E a gente conta nos dedos, de uma mão só, quem está vivo e pulsante depois de três décadas. Mas entendemos que criatividade boa é aquela que vende. Aquela que traz resultados. E isso temos nos mostrado ser bons no que fazemos.
A Bullet passou por reestruturação. Qual a necessidade das mudanças?
Muito menos uma questão de necessidade e mais uma questão de bom senso. A pandemia mexeu com a cabeça de todo mundo e criou novas referências. As pessoas entenderam que com menos conseguiam fazer mais. Muito mais. Menos tempo brigando pelo tamanho da sala, o cargo no cartão de visita, e foco na produtividade. No entanto, esse efeito de “reset” surgiu na minha vida bem antes, mais precisamente em 2017, quando me mudei para os Estados Unidos. Sempre amei o que fiz. Sempre adorei trabalhar. Mas o Brasil estava viciado em um modelo pesado, analógico e muito pouco sustentável. Concorrências predatórias, falta de ética no mercado, e baixíssima produtividade. Seis meses para colocar uma campanha de pé. Discussões com compras que todo mundo saia perdendo e custos operacionais altíssimos. Não é à toa que o mercado se dizia esgotado. Mas o que me deixava impaciente era ver que o mercado eram as agências e elas não faziam absolutamente nada para mudar essa realidade. E quando vi que existe uma vida do outro lado do hemisfério, percebi que era possível.
E o que você fez?
A cultura da confiança torna a nação mais simples, mais ética, mais focada. Tentei mudar o modelo, mas, por resistências internas e externas, não era possível aplicar a mesma fórmula, já que aqui, agência e cliente, estavam acomodados num modelo viciado e a agência contava com 170 talentos para mover a máquina, o que nos impedia de escolher que projetos trabalhar. O risco era inevitável, e tinha de se falar, sim, para tudo. No Brasil, nós, agências, sempre insistíamos em medir sucesso pelo tamanho da equipe. Um vício burro, uma egotrip que faz o cachorro cada vez mais correr atrás do rabo. Nizan (Guanaes) um dia soltou uma frase que ringed our bells: “As empresas hoje precisam ser leves. Quem tem custo, tem medo. Só a leveza vai te dar liberdade de dizer não ao cliente que não quer te pagar. Ainda que você esteja fazendo um grande trabalho”.
Nesse contexto, qual o modelo ideal?
Um modelo como o americano não tinha espaço para ego, desperdício de talentos ou velhas práticas. Mas como trocar o pneu com o carro andando? A conclusão era: só parando o carro. Eis que a pandemia pega o mundo de frente. O mundo parou. Momento triste, mas propício e único para resetar a máquina e trocar o pneu. “Imagina assim: o Safety Car entra na pista na hora que o carro está na entrada dos boxes. É entrar agora ou esperar a corrida recomeçar com o mesmo pneu”.
O mercado enfrentou momentos difíceis com a pandemia. Como a agência passou pelo período? Houve queda no faturamento?
Acho que o pior momento da pandemia foi a primeira semana. A Bullet era um agência prioritariamente de live marketing. E 40% do nosso negócio eram eventos. Nos Estados Unidos, 80%. Em uma semana, nove dos 12 eventos no pipeline foram cancelados. Na semana seguinte, os três restantes. Mas a Bullet não era só isso. Era planejamento estratégico, promoções, digital e influencer. E depois de todo mundo ficar congelado pelo susto, o mercado começou a reagir, e diria que meses depois os 60% dos negócios não afetados, que eram fundamentais para ativar a economia, foram altamente demandados e compensaram parte do faturamento perdido. No entanto, como a pandemia pegou a Bullet primeiro nos Estados Unidos, entre janeiro e fevereiro de 2020, não demoramos muito para implementar as mudanças que ensaiávamos há dois anos. Não cruzamos os braços um só minuto e começamos em março de 2020 a maior revolução que a Bullet já viveu.
Qual o sistema de trabalho que vocês adotaram após o pior da pandemia?
Eu já vivia o modelo híbrido desde quando estava nos Estados Unidos. Mas me sentia o patinho feio, pois era o único por vídeo. Na pandemia adotamos o home office, no entanto, com disciplina e tecnologia, criamos um ambiente virtual perfeito. Reuniões pontuais e diárias para manter o ritmo de trabalho e a cultura da agência. E rapidamente entendemos que o modelo de megassede, luxuosa, linda para postar no Instagram não fazia mais sentido. E fomos em busca do futuro da Bullet, assim que esse pesadelo terminasse. E sabíamos que nunca mais seríamos os mesmos. E o futuro que nos esperava era o híbrido definitivo. Cada um decidiria como iria trabalhar presencialmente. Quando ou se quisesse. Só tínhamos a ganhar: produtividade, menos tempo de locomoção e talentos localizados em todos os cantos do mundo (São Paulo, interior, Recife, Espanha, Miami e Nova York). E deu certo. O presencial é um fato. E o dia a dia é leve e flexível. E, em vez de ficarmos isolado no 15º. andar da Berrini (avenida na capital paulista), fomos atrás de um ambiente colaborativo. E nos juntamos a empresas inovadoras ao levar a Bullet pro State. Vizinha à Arca, uma fábrica de startups e empresas inovadoras como Braskem (Cazoolo), Soko, TokStok e Carrefour, entre outras.
A Bullet se inspira no modelo de trabalho norte-americano? Por quê?
Enquanto o mercado adaptava seus custos com reduções de jornada de trabalho e salários, partimos imediatamente para o modelo que já queríamos adotar. O modelo americano foi aplicado na prática. Uma agência de empreendedores que se propunha a remunerar todos os talentos pela performance de revenue (não de resultado). Sem limites. Sem condições. Sem burocracias. Um modelo matemático proprietário e complexo. Todo mundo passou a ter parte do negócio. Com isso, foi inevitável atrair gente que empreende para a mesa. E, assim, o time foi naturalmente sendo estruturado. A Bullet hoje tem pessoas talentosas que dividem o bolo, as angústias, as felicidades, as conquistas. E ainda outros talentos plugados em projetos que querem trabalhar na mesma pegada. Com vontade, com foco em resultado, sem desperdiçar recursos e tempo.
Você critica o modelo de trabalho brasileiro. Por quê?
O modelo atual já se mostrou desgastado. E hoje não faz mais sentido. Como disse, o modelo tradicional faz com que a agência fique correndo atrás do rabo. Fees são montados com base em número de pessoas e não em ideia ou produtividade. Assim, quanto mais se cobra, mais se contrata e vice-versa. Assusta-me hoje ver empresas ilustrando seu sucesso com o número de profissionais que tem, quando o sucesso deveria ser visto pelos trabalhos criados, resultados gerados e, claro, lucro na última linha. Nesse modelo, clientes pagam mais e agências lucram menos, quando deveria ser exatamente o contrário. Além disso, as relações se baseavam em quantidade e não empatia. Anunciantes muitas vezes faziam diversas agências (e pessoas) trabalharem de graça acreditando que quantidade de ideias resultaria numa grande ideia, quando buscar um parceiro por empatia sempre se provou ter mais resultado. Eu disse se baseavam porque sinto que as coisas estão mudando por aqui.
Fazendo um balanço dos últimos anos, quantos novos clientes a Bullet conquistou e quais?
No passado sabia-se que 40% dos recursos da agência eram desperdiçados com concorrências e projetos pontuais cancelados. Com este novo modelo aplicado, e com todo o time decidindo junto o caminho a percorrer, reduzimos drasticamente os projetos de risco e focamos em clientes recorrentes, que querem um parceiro estratégico, que remem junto neste mar agitado. Todos ganharam com isso: menos custos improdutivos repassados para clientes, equipe mais focada e agência mais leve e lucrativa. Isso significa não desperdiçar recursos em projetos de risco, e apenas trabalhar com clientes que a gente acredita. Mais do que isso: queremos trabalhar com quem quer trabalhar com a gente. Isso é ESG na essência. Fazer concorrência com sete agências, não. Por isso, reduzimos o volume de concorrências em quase 80%. E atraímos clientes com que temos o maior prazer em trabalhar.
Qual o faturamento da empresa e qual a expectativa para este ano?
Até setembro, a Bullet já tinha crescido em revenue 116% comparado com 2021, 166% comparado com 2020 e 42% se comparado aos níveis pré pandemia de 2019. Fee based representa 70% do negócio contra 30% anteriores. Isso tudo, somado a uma estrutura muito mais otimizada, que reflete em um resultado histórico. Sobre novas receitas, produtos proprietários já representam 19% do total.