Certa vez, eu estava sendo entrevistado para assumir a direção de criação de uma agência multinacional com atuação aqui no Brasil. Àquela altura da vida, já perto dos 30, já havia passado por algumas entrevistas, mas essa tinha peculiaridades – fui entrevistado por uma dezena de pessoas, em vários idiomas, inclusive pela própria diretora de criação, que não sabia que iria ganhar um novo par; ela chegou na sala “cuspindo fogo e arrotando brasa”, como se diz! Mas o que fez com que essa entrevista ficasse marcada para mim foi a pergunta de um dos entrevistadores: “O que é ser um criativo?” Respondi que era buscar constantemente pelo novo. Não satisfeito com a resposta, o interlocutor resolveu pedir que eu desse um exemplo de algo novo. Saia justa danada! Tenho certeza de que o Sérgio Valente e o Nizan Guanaes teriam dito, sem pestanejar, umas 10 ideias de bate-pronto.

Mas eu não sou esse cara; não consegui responder “na lata”, porque as minhas ideias nascem a conta-gotas, como uma gestação – e é dessa constatação que surge a minha pensata para este artigo. Afinal, de onde vêm as ideias? Confesso que já cheguei a pensar que algum ser etéreo as sopra no meu ouvido. Mas, hoje, digo com convicção que as minhas ideias partem da fonte mais inesgotável de inspiração: a própria vida. Eu me alimento da vida, das minhas experiências, do outro. Gosto de observar e de ter contato com gente. Olhando em retrospecto algumas das campanhas mais legais que já fiz, noto que todas nascem da inspiração do cotidiano, das pessoas, dos sentimentos… da vida como ela é! Para se ter boas ideias, é preciso ter repertório, ter uma bagagem de vivências, experiências, leituras... Não existe criativo sem conteúdo; o criativo não pode ser um ser superficial, raso, seja na música, nas artes, no cinema ou na propaganda. O resultado do nosso trabalho é o reflexo daquilo que somos, daquilo que vivemos, daquilo que capturamos e sentimos. O anestesista gaiato que operou o meu apêndice que o diga. Em meio à correria do pré-operatório – eu sentindo uma dor terrível! –, ele não parava de contar piadas, resultado: tempos depois, um paciente sendo operado foi parar no meu roteiro de uma campanha para a Fiat.

Uma das campanhas de maior sucesso que eu já criei foi a da Nova Schin: um grupo de amigos, nas mais diferentes situações: surfe, praia, balada, paquera… – quem lembra dessa? Cada diálogo, cada sacada para as brincadeiras nos roteiros, tudo estava, de alguma maneira, ligado às minhas vivências com os meus amigos de adolescência. Uma vida bem vivida, repleta de experiências, boas lembranças, amizades é a grande fonte primária da inspiração. Há criativos que se alimentam da própria criação: decoram os anuários de campanhas, sabem cada filme de cor, cada festival, cada ideia premiada, e seguem a lógica como princípio para suas criações. Não os condeno; mas continuo com a minha máxima: “Uma ideia concebida não é mais uma ideia nova”. Está faltando inspiração? A receita é: saia da cadeira do escritório da agência e vá viver!

PH Gomes é publicitário criativo, sócio e CCO da Greenz Aceleradora de Negócios